O dia em que eu joguei Bill Gates na piscina
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Esse não é necessariamente um texto com lição de moral. Pode até ser, se você encontrar alguma. Mas, em um primeiro momento, é apenas um texto que tive uma ideia e deu vontade de escrever. E é sobre uma ficção, mas poderia ser de verdade. Outro dia, estava eu, em um clube de campo onde estava acontecendo um congresso sobre tecnologia e educação. Gente de todo o mundo estava lá. Várias palestras, conferências e todo tipo de coisa que gente acadêmica gosta. Mas isso tudo não importa agora. O que é importante é falar da piscina, mas já vou voltar nela. Eu estava hospedado em um chalé com outros congressistas. Bem confortável até, e ficava próximo do prédio onde acontecia o congresso. O problema é que havia muitos arbustos e era praticamente impossível ir até lá, sendo nós obrigados a darmos uma volta e andar mais do que o necessário. A não ser que fôssemos pela piscina. Não me pergunte o porquê, eu não sei, não sou o dono daquele lugar, embora quisesse ser, mas a piscina era grande e o espaço entre ela e os arbustos era estreito. Não sei se dá para imaginar, pense assim: eu saía do chalé e via uma piscina com o prédio das palestras e apresentações supimpas ao fundo, e arbustos dos dois lados. Certamente um ótimo trabalho de paisagismo, do tipo “cara, os arbustos estão em promoção, vamos colocar arbusto até não ter mais espaço!”. Pois bem, em todos os momentos que eu precisava fazer o caminho chalé-congresso, eu ia andando na borda da piscina. Era até que larga para uma pessoa atravessar por vez, devia ter uns cinquenta centímetros de largura. Mas e se duas pessoas quisessem atravessar?
Bom, lá pelo terceiro dia do evento, estava eu atravessando os dez metros da piscina para ir assistir a uma conferência sobre o uso de softwares livres na educação e quando já tinha passado mais da metade da piscina, me deparo com nada mais e nada menos que Steve Jobs. Sim, o próprio estava no congresso, que até aquele momento eu achava que não teria ninguém conhecido assim. Estava o senhor da Apple com sua blusa preta e calças jeans em pleno verão andando na borda da piscina. Por um momento eu pensei “puxa, esse caminho que eu faço deve ser um caminho inovador, o Steve está fazendo o mesmo…” mas depois pensei o que ele estava fazendo ali, vendo que eu já estava quase no final do caminho. Bom, ele teria noção que eu já estava praticamente no final e ia voltar o pouco caminho que andou para que eu andasse. Mas não, ele ficou parado na minha frente de braços cruzados com aqueles óculos redondos brilhando com o sol, como se fosse obrigação minha, pobre estudante cheio de sonhos que a vida ainda não destruiu, a sair do caminho para que ele passasse, só porque havia uma pequena diferença de inovação entre nós. Seria isso uma luta de egos? Bom, meu texto publicado no jornal da faculdade criticando o preço da cantina não chegava aos pés de um Macintosh, mas era o máximo que eu podia fazer naquele momento.
Pensei, olhei para ele, ele olhou para mim, e eu entendi a mensagem. Era para que eu saísse do caminho. Talvez fosse um desafio proposto para mim, se eu resolvesse aquele enigma, conseguiria um emprego na empresa da maçã mordida de maneira estranha. Bom, após pensar em várias possibilidades, percebi que tinha três opções: ou eu pulava na piscina e me molhava, ou eu me jogava nos arbustos e me machucava ou eu andava todo o caminho de volta e esperava o rapaz de olhar estranho atravessar para refazer o meu caminho. Mas eu pensei diferente, e pensei em jogá-lo na piscina. Mas depois lembrei que a Apple entra na justiça por qualquer coisa, então, como sou eu quem está contando essa história que nunca aconteceu, ou talvez tenha acontecido mas ninguém saberá a verdade, resolvi mudar o personagem. Não era o Steve Jobs, era o Bill Gates. Pronto, melhor assim, faz mais sentido o Bill num congresso de informática na educação do que o Steve. Não que isso seja algo bom, mas não vem ao caso agora. O que importa é que estava lá, Bill e seus óculos não tão redondos olhando para mim, querendo que eu saísse de seu caminho. Pois bem, eu tinha três opções. Ou eu pedia para que ele saísse, ou o jogava nos arbustos ou o jogava na piscina. Eu até que pedi para que voltasse um pouco para trás, mas ele disse que não, que aquilo era um desafio que eu teria de superar se quisesse continuar a andar ali. Só não sei, e talvez nunca mais saiba depois do ocorrido, se isso era um tipo de desafio de inovação, e dependendo da solução mirabolante encontrada por mim eu seria contratado para trabalhar na Microsoft, ou se ele só estava sendo folgado mesmo. Bom, eu tinha duas opções, piscina ou arbustos. Nos arbustos ele iria se machucar, eu pensei. Mas… a piscina… Claro, a piscina! Seria uma vingança muito maior, por todas as telas azuis que vi durante minha vida, por todos os arquivos perdidos antes de serem salvos pelo botãozinho do disquete, enfim, pelo preço abusivo do Windows.
E, pronto, um dos maiores nomes da tecnologia caía na piscina, junto com todas as minhas mágoas com o Visual Basic, e todas as discordâncias nos projetos educacionais da Fundação Gates. Ele ficou alternando entre olhar para mim com um olhar de ódio mortal e olhar em volta procurando a escadinha da piscina. Enquanto isso, eu continuei em meu caminho triunfal, em direção à palestra que aconteceria perto dali. A expectativa era muito grande, mas vou resumir minha frustração em poucas palavras: o palestrante ficou doente, não teve palestra e eu fui expulso de lá por ter jogado um dos patrocinadores do congresso na piscina. Mas em minha cabeça, a música era de vitória.